Houve um tempo em que as pessoas, ao tomar um coletivo, precisavam esperar seu ônibus parar de ponto em ponto até que, finalmente, chegassem ao destino. Naquela época, em todo lugar era assim. E ninguém imaginava que, de algum modo, isso pudesse ser diferente.
Quase ninguém.
A inspiração veio da sensação de parar de aeroporto em aeroporto durante o retorno após uma longa viagem de trabalho. Assim nascia a ideia do arquiteto Carlos Eduardo Ceneviva para a criação de uma “linha direta” que fosse de um ponto importante a outro, sem paradas intermediárias. Só que no transporte público esse conceito não existia. Como então fazer acontecer uma ideia assim tão inovadora?
Em 1990, porém, nosso prefeito era o arquiteto Jaime Lerner, Ceneviva era presidente da URBS, e a cidade da qual falamos é Curitiba. Isso muda tudo! Afinal de contas, para um lugar que já tinha tido a primeira rua só de pedestres do mundo, a Rua XV, e um xadrez gigante feito por Juarez Machado, por que não ter o primeiro “ligeirinho” também?
Tempos inovadores estes. As pessoas certas, nos lugares certos, e na época certa. Minha história como engenheiro começa aí. Em 1991, concluí na UFPR o curso de engenharia civil e, no meu primeiro emprego, minha primeira obra foi a condução do Terminal de Ônibus do Sítio Cercado pela Construtora APC – Arquitetura, Planejamento e Construção Ltda, feito em apenas quatro meses.
Há coisas neste mundo que fazemos porque gostamos. Outras fazemos porque queremos que sejam feitas. E ainda algumas porque queremos, simplesmente, que terminem. Mas poucas vezes pensamos que, trinta anos adiante, elas ainda estarão lá. Ajudando e fazendo parte da vida das pessoas comuns que as usam, elas ainda estarão lá.
Talvez o segredo seja este: fazer acontecer.
Em 1991, para que o novo sistema do ônibus “ligeirinho” funcionasse, foi necessária a execução de cinco novos terminais (Santa Felicidade, Barreirinha, Bairro Alto, Sítio Cercado e Fazendinha). Com isso, parte da cidade foi resgatada. Antes, onde havia apenas áreas servidas por alimentadores, agora tinham sido construídos grandes terminais. E com a promessa de ampliação com ruas da cidadania, postos de saúde, etc, e todo o progresso que vemos hoje em 2024. Foi uma época em que pessoas inteligentes, com capacidade de fazer e vontade de acontecer estiveram entre nós. Então é mentira que “engenheiros, arquitetos e outros técnicos só sabem pensar em gente rica e se esquecem dos pobres”. O ônibus ligeirinho, em sua concepção e implantação, é prova disso.
Mas, e agora? Hoje em dia, tudo isso ainda funciona?
Olhemos para a frente e para soluções. Quando se quer resolver algo, é preciso que haja gente que queira resolver. Mas não basta boa vontade. É preciso capacidade, é preciso formação e, certeza absoluta. A grande lição que mestres como Ivo Arzua, Jaime Lerner, Carlos Ceneviva, Manoel Coelho, Cássio Taniguchi, e tantos outros engenheiros e arquitetos nos deixam é esta: antes da pessoa política, tem que haver a visão técnica. E antes da visão técnica, tem que haver o olhar de gente. Gente que faz acontecer.
Por Luiz Henrique Maleski, engenheiro, Curitiba